em: http://www.ffms.pt/xxi-ter-opiniao/artigo/393/circulos-uninominais-o-parlamento-e-o-povo
"Todos os sistemas eleitorais têm vantagens e inconvenientes: nem o uninominal é perfeito, nem o proporcional é destituído de sentido. Acontece que, tendo em conta os prós e os contras, considero que o primeiro é melhor do que o segundo. Nas raras ocasiões em que foi dado percorrer os corredores do Parlamento, ao olhar aqueles homens de caras macilenta, a minha alma encheu-se de melancolia. Em vez de procurarem ganhar o pão, cá fora, com o suor do seu rosto, os deputados – ou, para ser rigorosa, a maior parte deles – são condenados a passar o tempo num espaço significativamente designado por Passos Perdidos. Lá em cima, na mesa, o presidente tem, a seu lado, dois indivíduos, procurando matar o tédio com o telemóvel. É um espectáculo triste. E, além de triste, dispendioso. Não tanto devido aos salários que auferem, mas devido aos custos com a manutenção do edifício, com a transcrição do que dizem e com as deslocações ao estrangeiro. É caso para nos interrogarmos o que estão ali a fazer. Vigiam eles as acções do Governo? Não. Elaboram leis susceptíveis de melhorar as nossas vidas? Não. São capazes de produzir um discurso susceptível de levantar o moral nacional? Não. Têm opiniões? Não. Estudam dossiers analisados em comissões especializadas? Não. Têm ao seu dispor equipas que os ajudem a formular políticas alternativas? Não. São independentes dos partidos a cujo patrocínio devem a eleição? Não. Esta última questão remete para um aspecto curioso. Os deputados votam sempre em grupo. Quando um dos capatazes, o líder parlamentar, se ergue, os outros imitam-no, levantando-se também. Quando aquele apupa um orador, os membros do grupo fazem o mesmo. As ocasiões em que alguém toca uma nota dissonante são tão raras que até eu sou capaz de as enumerar. Por outro lado, os indivíduos presentes no hemiciclo estão em constante variação. Aparentemente, combinam revezar-se, de forma a que o sofrimento seja mais tolerável. De cada vez que algum tem qualquer coisa melhor a fazer cá fora ou tão - só quando se sente em vias de desfalecer, combina com um parceiro – o nome seguinte nas listas – a substituição. Isto acarreta uma rotatividade insalubre. As equipas partidárias renovam-se sem que os eleitores tenham tempo de ficar a conhecer quem os representa. Quando os deputados vão para o Governo, ainda existe uma justificação. Em todos os outros casos – apetites, amuos, mortes – a saída deveria conduzir a uma nova eleição. Causa espanto que, desde há trinta anos, nada tenha sido alterado, mas é preciso lembrar que os partidos estão interessados na manutenção do status quo. De vez em quando, aparecem uns maduros a criticar o sistema, com base em que este tende a afastar os eleitos dos eleitores. Mas, que eleitor, depois de se ter dado à maçada de, uma vez, em cada quatro anos, ter ido colocar uma cruz num símbolo – para só citar os dos partidos mais importantes, um punho cerrado, uma foice e um martelo, uma seta empinada, uma bola ameaçada por duas setas e um boneco desarticulado – quer saber quem é o "seu" deputado?. A maioria olha a lei eleitoral como a tábua dos Dez Mandamentos, ou seja, como um documento, vindo de tempos imemoriais, em que se não pode tocar. Oliveira Martins e Eça de Queirós Mas será que isto foi sempre assim? Muitos pensam que sim, mas não é verdade. Infelizmente, os legisladores que redigiram a Constituição de 1976, e, depois, a lei eleitoral, imaginavam que o mundo nascera com a implantação da I República (uma coisa boa) e com a instauração do Estado Novo (uma coisa má). Esquecem que, antes de 1910, houve um regime mais liberal do que os que lhe sucederam. Chamava-se Monarquia Constitucional. Inspirada, em grande medida, em Portugal Contemporâneo, de Oliveira Martins, e Os Maias, de Eça de Queirós, a historiografia, de esquerda e de direita, tende a dar-nos um retrato negativo do período, mas é preciso ler estes dois livros com cautela. Por muito bem escritos que estejam – e estão-no – não podemos subestimar o facto de os seus autores terem como objectivo denegrir a política, não podendo assim ser tomados à letra. Dado que iremos falar sobre as décadas em que vigorou, em Portugal, um sistema eleitoral baseado em pequenos círculos uninominais, vale a pena demorar-nos um pouco sobre o século XIX. A Carta Constitucional de 1826, outorgada (isto é, dada) por D. Pedro IV à nação, não tinha raízes no país. Daí a dificuldade que os portugueses tiveram em perceber o significado do papel, a Carta Constitucional, trazido, do Brasil para a Metrópole, pelo inglês Lord Stuart, embaixador do seu país em Portugal. Seguiram- se várias guerras civis, até que, fartos de se matarem uns aos outros, em 1851, os portugueses aceitaram, com indiferença, o que o Duque de Saldanha lhes propunha, isto é, uma reconciliação imposta pelas baionetas, como, muito depois, aconteceria, a 5 de Outubro de 1910, a 28 de Maio de 1926 e a 25 de Abril de 1974. Todos os regimes portugueses nasceram de golpes militares. Salto por cima das primeiras décadas do regime liberal, atravessadas por guerras civis, para me concentrar na segunda metade do século. É durante este período que se adoptou um regime eleitoral novo, o dos círculos uninominais. Esta forma de eleger os deputados teria lugar após outra modificação, que consistiu no facto de as eleições terem passado a ser directas, uma medida há muito reivindicada pela esquerda, isto é, pelos chamados Setembristas. Mas nem todos podiam votar, uma situação que hoje surge como estranha, mas que, à época, era normal. O eleitor teria de possuir um certo rendimento, visto presumir-se que apenas os proprietários, com interesse na gestão da coisa pública, deveriam votar. A direita reagiu contra as eleições directas, mas acabou por perder. O regime nascera à esquerda e à esquerda se manteria. A 16 de Março de 1859, tomava posse um governo liderado pelo Duque da Terceira, tendo, na pasta do Reino, um jovem que já se havia destacado durante o primeiro governo da Regeneração, Fontes Pereira de Melo. Este herdou um projecto de lei, sobre o escrutínio eleitoral, já discutido no anterior governo: as eleições deixariam de ser feitas por listas, passando a ter por base círculos uninominais (165), os quais correspondiam, grosso modo, aos concelhos. A proposta recebeu poucas críticas. As que se ouviram incidiram em dois tópicos: a passar, a lei minaria a força do Executivo e colocaria os interesses locais à frente dos nacionais. Nada disto impressionou Fontes. Embora um centralizador, não queria discussões com o rei D. Pedro V, que o detestava. Influenciado pela correspondência mantida com o seu tio, o Príncipe Alberto de Inglaterra, o monarca português considerava necessária uma reforma eleitoral, de forma a aproximar a forma de votação em Portugal da inglesa. Forçou a mão de Fontes, que, por uma vez, fez o que o rei pretendia. Foi por influência real que, entre 1859 e 1895, as eleições se fizeram com base em círculos uninominais. Tudo correu bem até ao início da década de 1890, quando o país entrou em colapso. O Ministro do Reino, João Franco, decidiu introduzir alterações à lei eleitoral. Entre outras modificações, figurava o escrutínio por listas, com base em 17 circunscrições, correspondendo, mais ou menos, aos distritos. Mas não contara com as resistências que o decreto provocaria. Nas eleições seguintes, os dois grandes partidos abstiveram-se, pelo que teve de recuar, apresentando, em 1896, outra reforma: a lei, aprovada a 21 de Maio, estipulava que, na província, os círculos uninominais seriam reintroduzidos. Os caciques obtiveram o que desejavam. Não se deve estar sempre a comparar Portugal com que o que se passou em países económica e politicamente mais avançados. É evidente que, se comparado com o inglês, o liberalismo português era peculiar. Não existia aqui, como no Reino Único, o equilíbrio, entre classes sociais e a Coroa, que permitira a emergência de um regime em que o Parlamento era soberano. Desta constatação não se deve concluir, como o fizeram, primeiro, os ideólogos republicanos e, mais tarde, os doutrinários do Estado Novo, que o século XIX foi um descalabro. Sem uma aristocracia fundiária, com uma burguesia débil e com um operariado incipiente, tudo seguiu um rumo diferente do inglês, mas a segunda metade do século constituiu um período excepcionalmente tolerante. O homem das finanças Na viragem do século, acossado pela expansão do Republicanismo, o regime fechou-se. A 5 de Outubro de 1910, um punhado de militares e civis, barricados na Rotunda, derrubou a Monarquia. Apesar das promessas, em vez de alargar, o novo regime restringiu o sufrágio. Não contente com isto, em vez de círculos uninominais, optou pelo escrutínio baseado em grandes círculos. Nas cidades, não tardou que os operários se revoltassem; nos campos, os camponeses odiavam os novos caciques com um furor desconhecido. Mesmo os trabalhadores que podiam votar deixaram de o fazer. Em Lisboa, no fim da República, a abstenção global chegava aos 86%. Em 1926, o general Gomes da Costa montou em Braga o seu cavalo branco, descendo rumo à capital, a fim de impor um módico de ordem. Dada a sua inexperiência, não tardou a cometer erros, pelo que acabou afastado. Depois de voltas e reviravoltas, alguém se lembrou de ir a Coimbra buscar um professor de Direito, que sabia de Finanças, o que era conveniente, dado que a República fora perdulária. Salazar chegou e venceu. Durante o Estado Novo, o debate sobre as vantagens de círculos uninominais versus listas deixou, em grande medida, de ter significado. O sistema escolhido foi o maioritário de lista, com círculo único até 1945, e círculos distritais, a partir desta data. No final da II Grande Guerra, passou-se de um sistema plebiscitário e não concorrencial para um sistema de concorrência simulada e de hegemonia garantida. As eleições eram antecedidas de um período em que a Censura e a repressão sobre a oposição abrandavam, mas não se pode falar verdadeiramente de eleições durante este período. A 25 de Abril de 1975, realizaram-se as primeiras eleições democráticas e livres em Portugal. A Lei 3/74, promulgada a seguir ao golpe de Estado, consagrava a estrutura constitucional provisória, tendo sido aprovada pela Junta de Salvação Nacional. No seu art. 4.º abordavam-se as questões da lei eleitoral e da formação de uma Assembleia Constituinte. O governo provisório deveria nomear, no prazo de quinze dias, uma comissão para elaborar um projecto de lei, sujeito a aprovação no Conselho de Estado, de forma a que a lei pudesse estar publicada até 15 de Novembro desse ano. Em Maio, Palma Carlos foi escolhido para primeiro-ministro, cargo de que se viria a demitir cinquenta e seis dias depois. Para o substituir, o general Spínola convidou um militar, Vasco Gonçalves, o qual presidiria ao II governo provisório. O Presidente da República demitiu-se, em Setembro, após a manifestação da "maioria silenciosa", tendo a chefia do Estado passado a ser ocupada pelo general Costa Gomes, que manteve Vasco Gonçalves no poder. O método de Hondt Foi num contexto político turbulento – tinham ocorrido dezenas de prisões na sequência da manifestação de Setembro – que, a 15 de Novembro de 1974, foi publicado o decreto-lei n.º 621-C, relativo à organização das eleições. Aprovado em Conselho de Ministros, o diploma era assinado por Vasco Gonçalves e pelo seu ministro da Administração Interna, Costa Brás. O preâmbulo revela o carácter defensivo da lei: "Entre os diversos sistemas eleitorais possíveis, optou-se pelo sistema de representação proporcional, segundo o método de Hondt, por ser aquele que melhor poderá traduzir a vontade do corpo eleitoral, tendo já sido usado, nos círculos de Lisboa e do Porto, para a eleição da Constituinte de 1911". O novo poder reclamava-se da tradição da I República, um regime que, como vimos, de democrático pouco tinha. O seguinte foi pior, coisa que o legislador de 1974 recordava com deleite: "Meio século de farsas eleitorais fascistas, em que as próprias autoridades praticaram toda a casta de crimes eleitorais para defraudar a vontade popular, em que as mais diversas pressões eram feitas sobre os cidadãos no sentido de os obrigar a votar ou de os impedir de fazê-lo, criaram uma má tradição e o desprestígio da consulta democrática". Para o legislador, haveria duas tradições, uma nobre e pura, a da I República, e outra, mais escura que a noite escura, a do Estado Novo. A atitude do regime saído do 25 de Abril foi a mesma que presidira à I República: os líderes tinham medo de um povo, que, excepto em enclaves progressistas, era visto como fanático e reaccionário. Por isso se rodearam de leis que, embora democráticas, davam mais poder aos partidos do que aos eleitores. Sendo um jogo de soma zero, nós, eleitores, ficámos subalternizados. O ambiente que rodeou as eleições que tiveram lugar a 25 de Abril de 1975 era de cortar à faca. A extrema-esquerda, com poder entre os intelectuais, apelou ao voto em branco, o PCP discordava, em grande medida, da realização de eleições e o PS, em sintonia com os partidos de direita, desejava-as por admitir, com razão, que seria nas urnas que venceria o PCP (de facto, o PS recolheu 38% dos votos, enquanto o PCP se ficou pelos 13%). Durante um ano os deputados elaboraram a Constituição. Com mais de 32.000 palavras, é a mais longa de sempre e das mais longas do mundo. No seu preâmbulo, declarava-se – e declara-se – que o Movimento das Forças Armadas, "coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos mais profundos, derrubou o regime fascista". O gesto constituiria o "início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa", a qual, sob a sua égide, seria levada até ao socialismo. Eis a filosofia. Para o que nos interessa, cite-se o art. 155: "Os deputados são eleitos segundo o sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt". O matemático belga nunca teria imaginado ver o seu nome incluído numa Constituição, mas foi isso que aconteceu. Alvo de sete revisões, datando a última de 2005, o texto manteve em vigor o sistema eleitoral proporcional. A mais recente revisão alterou um aspecto. O seu art. 149 declara: "Os deputados são eleitos por círculos eleitorais geograficamente definidos na lei, a qual pode determinar a existência de círculos plurinominais e uninominais, bem como a respectiva natureza e complementaridade, por forma a assegurar o sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt na conversão dos votos em número de mandatos". O legislador abria uma frecha no bunker legal, mas, na prática, tudo se manteve. Aliás, a reforma eleitoral é um tema que diz pouco às populações. Vejamos como a introdução de uma lei que estipule a criação de círculos uninominais pode afectar a situação dos partidos. Os dois maiores, o PS e o PSD, são os que menos têm a perder: com máquinas montadas em todo o território, conseguirão sempre eleger deputados; o mesmo se não passa com os pequenos partidos, nomeadamente o CDS e o Bloco de Esquerda, estando o PCP numa posição perigosa, visto a sua votação estar altamente concentrada no Alentejo. Quem pretenda analisar a filigrana dos vários métodos eleitorais, pode entreter-se a ler o recente livro Eleições e Sistemas Eleitorais no Século XX Português (Lisboa, Colibri, 2011), coordenado por André Freire. Dos vários artigos, apenas me interessou o de António Filipe, um deputado do PCP que prima pela clareza das suas intervenções. O adjectivo que usa para falar da criação de círculos uninominais é interessante: "Considero-a verdadeiramente tóxica na medida em que tais círculos tornariam a proporcionalidade do sistema eleitoral meramente aparente (dos eleitores e das forças políticas) segundo uma lógica maioritária, levando, na melhor das hipóteses, a uma sobrepresentação dos dois maiores partidos e a uma representação meramente residual de todos os demais)". Apesar de reconhecer que deveria existir uma maior proximidade entre eleitos e eleitores, considerava que seria "um equívoco grave" pensar-se que os deputados deviam ser eleitos "procuradores dos interesses locais ou regionais". Para ele, o que distinguiria os deputados não eram os locais ou os interesses que os tinham levado até ao Parlamento, mas "as famílias políticas a que pertencem". Entendemos o motivo desta posição, mas julgamos que ela só nos pode conduzir ao desastre. Temos de escolher entre propor candidatos escolhidos pelas comunidades (correndo o risco de serem porta-vozes dos "interesses de campanário") ou ter deputados "pára-quedistas" (ou seja, designados pelos secretários-gerais). No século XIX, o cacique podia ter muitos defeitos, mas desempenhava funções úteis: constituía a forma encontrada pelas comunidades para fazer chegar junto do Estado as aspirações populares. Na prática, as eleições oitocentistas funcionavam como se fossem indirectas. O candidato a deputado conquistava o favor do "influente" e este convencia o povo a votar no indivíduo escolhido. Num país católico, onde o padrinho sempre foi uma instituição, isto parecia, e era, natural. Ao contrário do que sucedia em Inglaterra ou em França – e não tanto quanto se imagina – a noção de cidadania só existia na cabeça de alguns iluminados. Basta consultar os espólios de políticos, como José Luciano de Castro, ou de grandes proprietários, como José do Canto, para se perceber que nem tudo era tão negro quanto, por vezes, se imagina. É verdade que o caciquismo consagrava uma relação desigual, mas os favores passavam em ambos os sentidos. É importante distinguir o caciquismo, baseado na troca de favores, e os atropelos administrativos durante o acto eleitoral, de que o mais conhecido era a "chapelada" (a inclusão de votos falsos nas urnas). O primeiro era visto como normal, o segundo como a fraude que efectivamente era. Sendo o voto secreto – uma característica invulgarmente moderna – o povo português conseguia obter, com este mecanismo, algumas coisas. Os poderosos careciam de quem votasse neles e naturalmente o povo fazia chantagem a quem lhe pedia o voto. Todos os sistemas eleitorais têm vantagens e inconvenientes: nem o uninominal é perfeito, nem o proporcional é destituído de sentido. Acontece que, tendo em conta os prós e os contras, considero que o primeiro é melhor do que o segundo. Embora a memória do primeiro tenha desaparecido, de ambos temos experiência. O actual sistema permite aos partidos preencher as listas com nomes sonantes que, à primeira oportunidade, desaparecem do hemiciclo para empregos rentáveis; permite-lhes meter nas listas gente que ninguém conhece e que, por isso, ninguém elegeria; permite-lhes manter candidatos que, como deputados, nunca fizeram o que quer que seja. Por isso, o considero o pior das várias alternativas. É verdade que muitos votos – os que vão para os partidos pequenos – ficariam "desperdiçados", caso se adoptasse o sistema uninominal, mas é para corrigir isso que, em alguns países, como em França, se montou um esquema que prevê uma segunda volta. Quanto à objecção de que, ao serem eleitos por pequenos círculos, os deputados se transformariam em representantes de interesses mesquinhos, é um disparate. A missão dos deputados não consiste em falar em nome de uma nação que, neste contexto, é sinónimo de chefias partidárias, mas em representarem quem os elegeu. Em quem e como votar Filosófica e temperamentalmente, sou centralizadora. Todavia, no caso da lei eleitoral, a minha posição é diferente, porque considero que, diante da urna, ninguém melhor do que o próprio sabe o que lhe convém. Quero que aquilo que considero pernicioso no actual contexto – a regra da proporcionalidade, a interdição de candidatos independentes, a existência de grandes círculos, a possibilidade de substituição sem novas eleições, a confecção de listas pelos secretários-gerais – termine de vez. O PS, na oposição, vem agora reclamar a reforma das leis eleitorais, tendo o PSD respondido estar de acordo. É uma peça de teatro a que já assistimos. Se a opinião pública se não manifestar, tudo continuará como está. Outra anomalia diz respeito às candidaturas de independentes, assunto de que ainda se fala menos do que da organização da máquina eleitoral. Não bastava já aos partidos poderem cozinhar as listas, a Constituição declara que, para um indivíduo se candidatar, tem de estar filiado num partido ou de, em alternativa, lhe pedir boleia (art. 151). Se alguém, algures, desejar ser candidato a deputado, mesmo que tenha apoio local, não o poderá fazer. O facto de, para se ser elegível, ter de se mostrar o cartão partidário, é um atentado à liberdade. Nada e criada num país em que a política era vista como uma actividade desprezível – com o argumento de que o Prof. Salazar, que sabia o que queria e para onde ia, administraria a nação –, o ataque ao sistema político saído da Revolução de Abril pode parecer inoportuno. A esses, é preciso lembrar que o 25 de Abril foi há muito tempo. O facto de a maioria das pessoas da minha idade não estarem dispostas a denunciar o status quo faz com que os jovens nascidos depois de 1974 não se revejam num regime que consideram oligárquico, acéfalo e corrupto. Aliás, não são apenas os jovens que estão zangados. Os seus pais, ou muitos deles, tão-pouco vêem interesse em sair de casa, a fim de escolher entre desconhecidos que imaginam corruptos. Em 1975, um momento, reconheço-o, excepcional, a abstenção foi de apenas 8,3%. Em 1985, a taxa subiu para 25,8%, em 1995 para 33,7%, em 2005 para 35% e, em 2011, para 41,9%. Sei que, por toda a Europa, algo de semelhante se está a passar, mas não a esta velocidade. Ao falarmos de leis eleitorais, estamos a tocar em três questões fundamentais: quem pode votar em quem e como votar. A primeira questão está resolvida; a segunda e a terceira, não. Com receio de que o Norte se inclinasse para a reacção e de que o Sul ficasse vermelho, os constituintes optaram por uma lei – baseada em grandes círculos eleitorais e em listas confeccionadas pelas cúpulas partidárias – que retira poder ao eleitor e que infringe os direitos de quem se quiser candidatar fora dos partidos. Infelizmente, em vez de lutar pela alteração da lei, no sentido de consagrar pequenos círculos uninominais, o povo optou por desprezar todos os políticos. É assim que os regimes democráticos morrem."
por Maria Filomena Mónica.
Passos Coelho veio agora apregoar para a opinião pública uma sua surreal proposta de diálogo com os movimentos sociais originários do Facebook, criando no portal do governo um convite à criação e participação dos movimentos políticos e sociais.
A proposta, segundo o mesmo, tem em vista auscultar as pessoas e, passamos a citar, “permitir uma nova forma de comunicação com o Governo”, cabendo “ao proponente apresentar o seu movimento" e sendo prometido o doce ou a recompensa da "causa" com mais apoiantes poder vir a ser recebida pelo próprio Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.
Passos Coelho “him self” promete ser a própria recompensa do felizardo popular adepto desta surreal forma de comunicação do Governo da República.
É o populismo levado ao seu mais elevado grau.
É uma medida bem à medida do que lhe conhecíamos da “jotinha” laranja, de"fait divers" e "show off" para enganar tolinhos, e faz-nos lembrar de uma igual medida demagógica e falaciosa como a da Presidente da Assembleia da República para a realização de tertúlias populares dos deputados com os cidadãos, depois de ser apanhada abusivamente a acumular o salário com uma reforma e após as nossas insistentes denúncias.
Entretanto, entre alguns aderentes já posicionados no portal do Governo contam-se propostas de causas como as da “Legalização da Cannabis”, do “Descanso ao Domingo”, passando pela “Redução de Impostos” até ao de “Contra os trabalhos de Casa”, entre outras e mais de pasmar.
Ora, quando pensávamos que cabia ao Órgão máximo da Administração Pública governar e executar as respectivas funções públicas, constatamos agora que o Governo, de repente, se arvora como um canal de informação e comunicação, ou auscultação, públicas.
Mas isto também já não é novidade dos Governos da República, desde as pressões governamentais sobre a RTP, as Centrais de Comunicação de Santana Lopes, às tentativas de instrumentalização e às ameaças de Sócrates contra jornalistas e demais comunicação social, até às actuais fórmulas pró-freudianas de Passos Coelho, tudo parece valer a pena para Não Governar e para ir adormecendo o zé povinho.
A medida em causa de Passos Coelho também tem em vista a distorção e silenciamento da genuína liberdade de pensamento e expressão política de contestação popular que corre actualmente em catadupa e em abundante liberdade na blogosfera.
O fito e o intuito, em súmula, é a manipulação e a instrumentalização da opinião pública na blogosfera.
A medida, o que é facto, vinda poder efectivo, mais uma vez, apela à participação básica das pessoas, evitando questões essenciais do regime ou do sistema políticos, como por exemplo, tratar ou falar das alterações das leis eleitorais, ou do mais do que não abrem mão nem o Governo nem os Partidos Políticos com assento na Assembleia da República.
O poder político em Portugal, como há muito sabemos, não é nem se encontra feito de maneira para que os portugueses livremente legislem ou governem sobre os seu reais problemas e em ordem a resolve-los efectivamente.
Esta proposta de diálogo de Passos Coelho é, afinal de contas, não mais do que uma demagógica e cretina participação popular, fazendo o convite ao mesquinho e ao pequenino, ao popularucho e à infantilidade.
O real exercício político do bloco partidário instalado do arco do poder é, sabemo-lo há muito, um largo conjunto de interesses que se encontram alheados dos reais e efectivos problemas dos portugueses.
O que Passos Coelho e os seus acólitos pretendem é, uma vez mais, manterem-se por toda e qualquer via, recorrendo a todos e quaisquer expedientes demagógicos e infantis, fazendo permanecer a sua real incompetência.
Esta República é a República da imensa e improdutiva prol de ineptos e incompetentes que a ela se encontra associada.
A medida em causa não visa jamais a real democracia de cidadãos, no lugar próprio e por direito próprios.
Tal nunca se confundiria, nem confunde, por favor de conversinhas ou circunlóquios de ocasião como esta peregrina medida do Portal do Governo.
Ora, com a manutenção dos incompetentes desta III República nos Governos jamais haverão soluções.
Mas a medida de associação popular ao portal do Governo de Passos Coelho é e bem uma efectiva e cabal demonstração da inutilidade dos Governos da República.
Ao convite de Passos Coelho os inúmeros e valorosos movimentos sociais e políticos e os seus autores responderam-lhe em uníssono: os portugueses de boa-vontade pretendem por si e pelos seus próprios meios, capacidades e inteligência Governarem a bem de Portugal e, de tal modo, a poderem resolver efectiva, séria e competentemente os seus destinos.
Na verdade, se os portugueses trabalhadores e profissionais chegassem ao Parlamento e à Governação, rápida, efectiva e com utilidade, a presente situação desastrosa em que todos nós nos encontramos seria imediatamente resolvida.
Os portugueses sabem quais são os reais problemas e questões a resolver em Portugal, e sabem bem onde e quem são os corruptos e os agentes que entravam o livre e bom crescimento de Portugal.
O problema de Portugal, desde há mais de 100 anos, ou pelo menos desde os primórdios da implantação da República, não são nem nunca foram os portugueses.
Os problemas actuais dos portugueses são os políticos e a sua raça nefasta e destrutiva, acompanhados do actual regime e sistema políticos partidocrático e cleptocrático.
Assim sabendo nós sobejamente, perguntamos: porque raio é que estes políticos e governantes portugueses não emigram e deixam para os portugueses o seu amado país e nação de Portugal?
«Ainda as listas»
Por António Barreto.
Jornal "Público", 16 de Janeiro de 2005.
«A discussão sobre os sistemas eleitorais pode, em plena campanha, parecer extemporânea. Não é a altura adequada a mudar as regras e as atenções estão mais viradas para os temas próprios da operação, seja a habitual demagogia, sejam os problemas sociais e políticos. No entanto, a oportunidade é maior do que parece: diante de nós estão todos os exemplos do sistema absurdo em vigor. E também é pertinente convidar os partidos a definirem, nos programas, as suas opiniões sobre o assunto.
Um dos motivos invocados para debater ou corrigir o sistema eleitoral consiste na necessidade de produzir um parlamento melhor e eleger deputados mais capazes. Eis uma ideia errada que corre o risco de tornar inúteis as discussões. Nada garante que as actuais listas blindadas de candidatos substituíveis produzam deputados inferiores ou superiores aos que resultariam de listas individuais e de círculos uninominais. Mesmo que fossem permitidas as candidaturas independentes, que defendo, ou que fossem proibidas as substituições dos eleitos, que preconizo, nenhum dispositivo miraculoso faria com que os felizes vencedores fossem impolutos, competentes e de dedicados servidores da causa pública.
Os argumentos sobre o valor do deputado desnaturam o debate. Na verdade, o que está em causa são os eleitores, não os eleitos. O aspecto mais importante de um sistema eleitoral é o poder conferido ao eleitor, não a qualidade do órgão eleito. É nesse sentido que defendo a criação de círculos uninominais; a proibição de substituições de deputados eleitos; e a possibilidade de apresentação de candidaturas independentes. Como não existem sistemas eleitorais perfeitos, sei que o de círculos uninominais tem defeitos. Mas também sabemos que existem dispositivos para os compensar ou corrigir. Em França, na Grã Bretanha, na Irlanda, na Alemanha, na Dinamarca e noutros países, há sólidas experiências consolidadas. Por mim, prefiro o sistema uninominal a duas voltas, como em França, mas não me choca que outros sejam os correctores, como, por exemplo, um círculo nacional.
Não sei, repito, se os círculos uninominais fazem melhores ou piores deputados do que aqueles que temos. Nem sei se os círculos uninominais estimulam ou travam os deputados pára-quedistas impostos pelo chefe nacional do partido e por Lisboa, inquietação expressa por Vital Moreira neste jornal. Mas sei que, com tempo, os círculos uninominais alteram, a favor do eleitorado e das comunidades locais, incluindo as secções dos partidos, a relação de forças com a capital e os dirigentes partidários. E é isso que pretendo: um sistema eleitoral que dê ao eleitorado a capacidade de identificar o mandato que confere, isto é, de saber em quem vota e de ter a certeza de que o eleito cumpre o seu mandato até ao fim (ou que, se o não fizer, o seu lugar não será preenchido por obscuro suplente, mas sim substituído por nova eleição parcial). O que desejo é que o eleitor tenha nas suas mãos um boletim de voto em que constem os nomes de pessoas, cada uma representando um partido, um grupo, uma ideologia, um interesse ou mesmo um capricho. Não quero que o eleitor tenha nas mãos um boletim de voto com logotipos e emblemas.
Pretendo que os cidadãos, nas suas comunidades, organizados ou não em partidos, tenham a capacidade de se entenderem na escolha de um candidato; ou possam escolher, entre vários do mesmo partido, o favorito; ou consigam negociar com o poder central do partido a designação, entre indígenas e pára-quedistas, do candidato; ou finalmente possam procurar, noutras paragens, um candidato que julguem ser capaz de defender as suas ideias e os seus interesses.
Com os círculos uninominais, confere-se mais liberdade individual ao deputado eleito. A vantagem não é sobretudo dele, ou não tanto dele, mas, uma vez mais, do eleitorado. Este ficará melhor representado se o seu deputado tiver uma independência razoável que lhe permita negociar em permanência com os poderes centrais. Um deputado mais livre e mais independente dos chefes partidários fica, ao mesmo tempo, mais dependente do seu eleitorado. O que é positivo. O objectivo é o de reforçar esta dependência, não para tolher o seu papel de representante, mas para lhe permitir negociar as duas dependências, do partido nacional e do organismo local ou da comunidade a que pertence.
Desejo que os eleitores tenham mais liberdade, mais força e mais escolhas e não estejam limitados aos candidatos oficiais dos partidos. Quero que tenham a possibilidade de votar em candidatos independentes ou de partidos locais ou mesmo de grupos de interesses efémeros. Essa mera possibilidade aumenta os poderes dos eleitores e dos membros locais dos partidos, que ficariam assim mais bem armados para negociar a selecção de candidatos. Não esqueço que uma das capacidades dos cidadãos ou órgãos locais dos partidos será a de procurar, fora das suas fronteiras territoriais, candidatos fortes e conhecidos. A liberdade do cidadão não se pode limitar a ter de escolher entre as pessoas da sua comunidade: pode muito bem acontecer que se sinta mais bem representado por uma figura exterior. Desde que desejada e negociada.
Os círculos uninominais transformam um deputado eleito em representante de toda a comunidade do seu círculo. Em contraste, as listas partidárias blindadas, em sistema proporcional, fazem dos deputados representantes dos partidos. Em Portugal não há um deputado de Vila Real, de Benfica ou de Loulé, mas sim do PSD, do PS ou do PCP. Com deputados de círculo, qualquer cidadão, em qualquer comunidade, pode dirigir-se ao seu deputado, sem olhar às suas preferências partidárias. A proeminência partidária (na verdade, um monopólio) é tal que há em Portugal muita gente que não tem deputado. Com o sistema que temos, seria necessário que os partidos tivessem deputados em todos os distritos para que toda a gente se sentisse representada.
Em resumo. A questão pode parecer obscura, distante dos problemas emocionantes da saúde e do desemprego. Mas, na verdade, é no sistema eleitoral fechado, de monopólio partidário e de irresponsabilidade individual que reside uma das causas do mal-estar político crescente em que vivemos. Um sistema eleitoral estabelece regras e relações de força entre os cidadãos e as organizações políticas, entre eleitores e partidos, entre as comunidades locais e o poder central. Em Portugal, essa relação é desequilibrada, sempre em detrimento do eleitor, do cidadão, da comunidade e da organização local do partido ou dos interesses. É esse desequilíbrio que importa corrigir, recorrendo aos círculos uninominais e a um sistema aberto. Quase só os dirigentes partidários o negam. Percebe-se porquê. Como sempre, o voto é uma arma. Mas hoje, não é do povo: é dos chefes de partido.»
Escrevemos aqui algumas das rubricas Existentes no Orçamento publicado em Diário da República.
Caso queiram consultar essa peça na íntegra só terão de ir ao site www.dre.pt e acederem ao Diário da República nº 28 - I série - datado de 10 de Fevereiro de 2010 - RESOLUÇÃO da Assembleia da República nº 11/2010.
Então DELICIEM-SE:
1 - Vencimento de Deputados …………………12 milhões e 349 mil Euros
2- Ajudas de Custo de Deputados............ 2 milhões e 724 mil Euros
3 - Transportes de Deputados................. 3 milhões e 869 mil Euros
4 - Deslocações e Estadas...................... 2 milhões e 363 mil Euros
5 - Assistência Técnica (?????)................ 2 milhões e 948 mil Euros (deve ser para apertar alguns parafusos um tanto desapertados!)
6 - Outros Trabalhos Especializados (???????)..... 3 milhões e 593 mil Euros (quais?...e pagos a quem?)
7 - SERVIÇO RESTAURANTE, REFEITÓRIO, CAFETARIA....961 mil Euros (EIA! Não chega à casa dos milhões!!! Andam a passar fome…)
8 - Subvenções aos Grupos Parlamentares... 970 mil Euros
9 - Equipamento de Informática.................. 2 milhões e 110 mil Euros
10 - Outros Investimentos (??????) ............ 2 milhões e 420 mil Euros
11 - Edifícios .......................................... 2 milhões e 686 mil Euros
12 – Transferências (???????) Diversas (????)..13 milhões e 506 mil Euros
13 - SUBVENÇÃO aos PARTIDOS representados na Assembleia da República……16 milhões e 977 mil Euros
14 - SUBVENÇÕES ESTATAIS PARA CAMPANHAS ELEITORAIS....73 milhões e 798 mil Euros
Isto são apenas algumas das rubricas do orçamento da ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA!
Em resumo: no total a despesa orçamentada para "aquela casinha", relativamente ao ano 2010 é: 191.405.356,61 Cêntimos (191 Milhões 405 mil 356 Euros e 61 cêntimos.
Actualmente são 230 deputados, façam uma "contita" e vejam quanto pagamos por cada um daqueles “senhores”: 832.197,20 EUROS (166.840 CONTOS!)
Por cada um daqueles lordes!!!