Saiu esta semana um acórdão do Tribunal da Relação do Porto que absolveu o sujeito que chamou de incompetentes e ladrões os funcionários do Fisco de Gaia.
Uma leitura atenta e desapaixonada permite entender melhor o sentido da absolvição.
Na verdade o sentido da decisão do acórdão não atinge a dimensão de escândalo ou perplexidade que a comunicação social lhe deu, nem sequer as palavras em causa e dirigidas pelo arguido ao fisco e ou aos funcionários chegam ao ponto, quer na forma como são colocadas, quer como para os fins que são usadas, de se considerarem, objectiva ou subjetivamente, aptas ou susceptíveis de ofenderem a honra, a estima ou a consideração dos eventuais visados.
Visados esses que, surpreendentemente, não existem e nem se identificam no processo, e essa omissão é um problema decisivo na sorte do processo em causa.
Também não se deixa de sublinhar, e é uma das causas decisivas para a absolvição daquele sujeito, o que abona pouco pelo jurista/Ministério Público (que não sabemos quem realmente foi) tratou da queixa e acompanhou o procedimento criminal em causa, que apresentou a queixa em nome do Serviço de Finanças de Gaia e enquadrou o tipo legal de crime como se tivesse tratado ou a alegada ofensa se tivesse dirigido a pessoa colectiva quando as mesmas se dirigiram aos seus funcionários, portanto quem foram efectiva e realmente os visados pelos impropérios (a entenderem-se que tivessem sido atentatórios e ofensivos da sua honra...) em causa, e deviam ter sido eles os queixosos e assistentes.
Ora, desculpem lá, mas quem saiu mesmo mais maltratada foi (in) competência de quem tratou do processo digas nunca nenhuma palavra ou expressão que possa envergonhar a tua mãe ou o que ela te ensinou.
Fora isso a liberdade de expressão deve ser aceite com a máxima amplitude, caso contrário entramos numa caminho perigoso de perseguição e proibições que facilmente nós levariam a uma ditadura ou uma sociedade ainda mais violenta e intolerante do que aquela que pretensamente se quer proteger, a torto e a direito, com processos e condenações judiciais.
Aliás, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem-se pronunciado pelo respeito da mais ampla tolerância com a liberdade de expressão, como sendo um pilar essencial das liberdades cívicas e democráticas.
Ou quem não se lembra do (mau) exemplo da condenação das "Pussy Riot" na Rússia???
Fica um conselho aos ouvidos mais sensíveis: tenham mais calma e menos pruridos, e façam "ouvidos de mercador" à má-língua, como fazem as "mulheres sérias".