A indescritível morte de 12 de Março do pacífico imigrante cidadão ucraniano, às mãos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, mostrou-nos um Estado Português hediondo.
Um total 12 elementos do SEF, vários seguranças privados e um enfermeiro, que poderiam ter evitado a lenta e agonizante perda de vida de Ihor Homenyuk, não tugiram nem mugiram, quando o lancinante sofria as agruras da vil, audível e bárbara tortura infligida pelos três carrascos.
É o Estado que temos, no qual nenhuma vida inocente se pode confiar, o reflexo da atual sociedade portuguesa profundamente disfuncional, violenta e injusta.
Os últimos muitos meses, desde Março até finais de Novembro, na tentativa de encobrimento deste vilipêndio humano, agora mais vergonhosamente na justiça, trouxe à superfície a consciência de impunidade, falsidade e imoralidade de um crescente número de agentes e funcionários públicos.
Mas os funcionários públicos zelosos portugueses apenas se limitam a seguir os piores exemplos que aprendem e observam das chefias e superiores, cujas ordens, instruções e despachos internos têm valor superior à lei geral da República.
Temo diariamente pelas nossas vidas, as armas e as licenças de matar pululam à nossa volta num cada vez maior número de agentes uniformizados, mas também à paisana, agora até os polícias municipais as possuem.
O corajoso médico legista que denunciou a macabra morte, perante um corpo visivelmente torturado e brutalizado pelos seus torcionários, foi sumariamente despedido.
A venal diretora do SEF, bem à imagem dos responsáveis políticos que a nomearam para o cargo, durante meses a fio disse e desdisse acobertando o escândalo inenarrável, até ao momento em que a verdade galgou a pouca vergonha do poder político e, a esforço, demitiu-se.
Já a desfaçatez do Ministro da Administração Interna, que tudo fez e desfez para se livrar da má fama do caso e a escamotear as suas responsabilidades, continua de vento em popa.
O Portugal moderno mostrou-nos uma vez mais um Estado onde campeia a mentira, as vidas humanas nada significam e a responsabilidade não faz parte do seu léxico.
Portugal um país de emigração e emigrantes, que hão de dizer os nossos milhões de emigrantes portugueses pelo mundo fora quando forem destratados pelos Estados que os acolhem?
A vilanagem há muito faz escola no Estado, dominando os centros de poder e decisão, ao ponto do Presidente da República não se atrever publicamente a exigir responsabilidades ao Governo por esta vergonha mundial.
Tanto os funcionários grunhos que torturam e matam, como os grunhos políticos engravatados que os recolhem e respaldam, igualmente indignos e javardos, conspurcam a República, o Estado de Direito e o nome de Portugal.
Tresandam!
(twitter: @passossergio)
(artigo do autor, publicado na edição de 30 de Dezembro de 2020 do jornal mensário regional "Horizonte" de Avelar, Ansião, Leiria)