A infeliz e recente morte de Odair Moniz, às mãos da polícia, deve obrigar-nos, por imperativo de ordem ética, civilizacional e legal, a questionar o grau do uso da força policial, as suas formas e os seus meios.
Numa sociedade organizada, no respeito de regras e princípios de coexistência pacífica e justa, sob a tutela do Estado de Direito Democrático, as forças policiais estão quotidianamente obrigadas a agir no respeito da dignidade, das liberdades, dos direitos e das garantias de todos os cidadãos, sem discriminação, ou distinção, de género, cor, identidade, opção política, religiosa, sexual, condição pessoal, social, económica e ou profissional.
As polícias, como executores autorizados do uso da força legítima do Estado, estão restritivamente limitados nesse uso, pela lei e respetivos regulamentos, nomeadamente e em particular, no que diz respeito à utilização de armas de fogo.
E, a primeira e prioritária condição, ou regra, é a que que os seus agentes, na sua atuação legal e autorizada, fazendo respeitar e cumprir a lei e a ordem, deverão sempre optar, preferencial e prioritariamente, por recorrer aos meios não violentos, ou humanitários, orientadas pela moderação, o diálogo e no respeito pela condição da pessoa humana.
Os princípios, valores e normas que informam a ordem jurídica nacional, depositária das Convenções e Cartas Internacionais dos Direitos Humanos, determinam que apenas se pode recorrer à força quando estritamente necessário e unicamente na medida em que tal seja necessário para o desempenho de funções legítimas no domínio da aplicação da lei.
Este desiderato resulta de um cuidadoso equilíbrio entre, por um lado, o dever das polícias de garantirem a ordem e a segurança pública e, por outro, o seu dever de proteger os direitos à vida, à liberdade e à segurança das pessoas.
O Decreto-Lei n.º 457/99, de 5 de novembro, que aprova o regime de utilização de armas de fogo e explosivos pelas forças e serviços de segurança, ou policiais, contem um conjunto de princípios e regras que delimitam, restringem e condicionam o uso das armas e demais meios letais.
Pese embora, aquele diploma legal contenha alguns critérios fluídos e indeterminados, portanto, exigindo muito bom senso aos agentes policiais, não deixa de ser fortemente restritivo, responsabilizante e proporcional para o uso de tais meios, ou instrumentos.
A pena de morte para os crimes políticos foi abolida em Portugal em 1852, para os crimes civis em 1867 e para os crimes militares em 1911, pelo que morte não mais pode ser determinada, por quaisquer formas, meios ou fins, do Estado.
O uso da força policial deve assim ser orientado para o alcance da paz e da ordem, nunca para semear a guerra, a desordem, a discórdia, a injustiça e, jamais, a morte.
O princípio básico de acordo para a convivência pacífica, tolerante e ordeira em sociedade, no que todos devemos estar ao menos e minimamente de acordo, é a de que a vida humana é o valor maior de todos, devendo nós tudo fazer para a preservar, já a sua retirada deverá ser evitada até ao limite máximo onde as nossas forças possam alcançar.
Hajam bom senso e juízo.
(artigo do autor, publicado na edição de 1 de novembro de 2024 do jornal mensário regional "Jornal Horizonte" de Avelar, Ansião, Leiria)