Na atual pandemia sanitária do Covid 19 os portugueses viram-se forçados ao confinamento social, laboral e, especialmente, nas matérias dos direitos, liberdade e garantias, sob a vigência do Estado de Emergência depararam-se com as mais variadas restrições e limitações de movimentos e circulação.
Segundo o artigo 19.º da Constituição da República Portuguesa - da “Suspensão do exercício de direitos” -, o Governo e o Presidente da República “não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de sítio ou de estado de emergência, declarados na forma prevista na Constituição”.
Ou seja, somente e com a prévia declaração do Estado de Emergência pela Assembleia da República, segundo o artigo 19.º da CRP, nos termos, condições e limites da Lei n.º 44/86, de 30 de Setembro, é que os cidadãos podem ver os seus movimentos cerceados por banda do Estado e das forças policiais.
Outrossim, tem jurídica e legalmente de se perguntar, com que base e fundamentos jurídicos, no presente momento, por uma mera declaração de Estado de Calamidade - da Lei n.º 27/2006, de 3 de Julho, que aprova a Lei de Bases da Proteção Civil -, portanto que serve apenas e tão-somente para enquadrar atuações da Prevenção Civil, em matérias de acidentes, catástrofes e outros eventos anormais de âmbito local ou regional, as polícias se podem arrogar dos poderes de restrição dos movimentos e liberdades de pessoas e mercadorias, confinem idosos à força em casa, e até mesmo detenham pessoas na via pública sob o pretexto da prática de pretensos ilícitos penais de Crimes de Desobediência?
A atuação das polícias e do Governo limitando, restringindo e cerceando os direitos e as liberdades das pessoas sem o imprescindível suporte legal do Estado de Emergência, tem assim de entender-se como sendo manifestamente excessiva, padecendo de evidente ilegalidade e, não desprezando, de flagrante inconstitucionalidade!
E sem que tais atuações das forças policiais tenham suficientes apoio e escopo legal e constitucional, como é que fica devidamente salvaguardado e protegido o Estado de Direito Democrático, e, fundamentalmente, fica assegurado o normal funcionamento da administração da Justiça?
O Estado de Direito Democrático jamais pode ser suspenso, cabendo aos advogados especiais responsabilidades no “Acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva” por parte dos cidadãos em geral, previsto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, bem assim na execução das normas legais processuais e procedimentos de defesa dos cidadãos atingidos pelos poderes públicos.
Temos que, no Estado de Calamidade, que mais não pode servir do que para proteger a saúde e a integridade pessoal e moral dos portugueses, as polícias, as autoridades e demais agentes públicos jamais poderão atuar em prejuízo e atropelo dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
(twitter: @passossergio)
(artigo do autor, publicado na edição de 30 de Junho de 2020 do jornal mensário regional "Horizonte" de Avelar, Ansião, Leiria)